CÉREBRO QUE NÃO AMA: NEUROCIÊNCIA DA PSICOPATIA FEMININA

Falar profundamente sobre mulheres psicopatas exige abordar aspectos clínicos, sociais e culturais. A psicopatia em mulheres existe, mas é frequentemente subestimada, mal diagnosticada ou mascarada por padrões de comportamento diferentes dos observados em homens.

O que é psicopatia?

A psicopatia é um transtorno de personalidade e sua característica mais relevante é uma alteração de caráter, que faz com que indivíduos tenham comportamentos patológicos para controlar e manipular pessoas com mais facilidade. Se caracteriza por traços como falta de empatia, manipulação, egocentrismo extremo, impulsividade, ausência de remorso, comportamento antissocial persistente.

É um estado mental patológico que se configura por desvios, principalmente de caráter, que costumam ir se formando desde a infância. Na maioria das vezes, é nessa fase e na adolescência que alguns dos sintomas podem ser observados, por meio de comportamentos agressivos denominados de transtornos de conduta (denominação dada nessas fases).

A psicopatia só pode ser diagnosticada a partir dos dezoito anos de idade, por fazer parte dos transtornos de personalidade. É importante ressaltar que os transtornos de personalidade não são exatamente doenças, mas anormalidades do desenvolvimento psicológico que prejudicam a integração psíquica de forma persistente e causam no sujeito padrões profundamente desalinhados e entranhados, tanto em relação a seus relacionamentos, quanto à percepção do ambiente e de si mesmos.

Com o desenvolvimento do indivíduo, a psicopatia se torna um fator de risco, pois o mesmo pode cometer atos infracionais, utilizando charme, manipulação, mentira, violência e intimidação para controlar as pessoas e alcançar seus objetivos.

Outros transtornos podem possuir características bastante semelhantes as da psicopatia, também conhecidos como o transtorno de personalidade antissocial (TPAS) e a sociopatia. Mas, de acordo com Hare (1991) a psicopatia apresenta características distintas dos antissociais e sociopatas. Segundo a APA (2002), a classificação do transtorno de personalidade antissocial é a mesma da psicopatia e da sociopatia. Para a psiquiatria, esses traços se enquadram no Transtorno de Personalidade Antissocial (TPA), segundo o DSM-5, embora a psicopatia seja uma categoria mais específica e profunda (sobretudo na psicologia forense).

Psicopatia e Funções Cerebrais

Existem evidências de que anormalidades cerebrais podem estar relacionadas com o aparecimento de comportamentos semelhantes aos de psicopatas. Esse transtorno ocorre tanto em homens quanto em mulheres, mas cada sexo apresenta peculiaridades, principalmente em relação à forma do comportamento manifesto.

Segundo Adrian Rain, um dos pioneiros da neurocriminologia, algumas evidências resultantes de pesquisas nesta área indicam que anomalias cerebrais podem ser as causas de inúmeros aspectos clínicos da psicopatia. Existem indícios de que problemas emocionais também podem estar associados com algum tipo de dano no córtex pré-frontal, além das questões psicológicas e sociais envolvidas nas características dos psicopatas.

De acordo com Rain, pesquisas apontam uma associação entre lesões pré-frontais e comportamentos impulsivos, agressividade e inadequação social. A sociopatia é um exemplo de alteração de comportamento que pode ocorrer depois de uma lesão nesta área, ou seja, o sujeito apresenta comportamentos dentro dos padrões normais e ao sofrer um acidente afetando o córtex passa a apresentar comportamentos antissociais. Essas evidências confirmam a tese de que possa existir um elemento cerebral envolvido no comportamento dos psicopatas.

Segundo James Blair, algumas pesquisas que utilizaram neuroimagem encontraram uma diminuição da matéria cinzenta na região pré-frontal, um crescimento da matéria branca do corpo caloso e uma diminuição do tamanho do hipocampo posterior. Tais distinções contribuiriam para o aparecimento de comportamentos mais agressivos.

Existem indicativos de que possa haver ligação entre disfunção cerebral e comportamento agressivo ligado à psicopatia, mas pesquisas mais detalhadas e aprofundadas em relação ao funcionamento cerebral ainda precisam ser feitas, pois ainda não existem dados definitivos a respeito.

Gênero e Psicopatia

Em relação ao gênero, a psicopatia pode apresentar algumas particularidades, quando se trata de incidência, curso, comportamentos e idade de manifestação entre os sexos. No sexo feminino, os primeiros sintomas costumam aparecer durante o período da pré-puberdade. Já no sexo masculino aparecem antes desta fase. A frequência e a incidência de mulheres psicopatas são menores que a dos homens, chegando a menos da metade de mulheres diagnosticadas com este transtorno. Mas, em contrapartida, existem poucos estudos relacionando o sexo feminino à psicopatia. Será que a psicopatia está sendo pesquisada e diagnosticada no sexo feminino?

Segundo Raine, dentre os 20 itens presentes no PCL-R, a insensibilidade, a falta de empatia e a delinquência juvenil determinaram o gênero masculino, enquanto o comportamento sexual promíscuo determinou o gênero feminino, ratificando estudos e pesquisas feitas por outros autores, que também relacionaram o sexo feminino aos comportamentos de promiscuidade e abuso de substâncias alcoólicas.

Estudo feito com mulheres presidiárias, em que foi aplicada a escala HARE PCL-R, observou uma relação com ansiedade, depressão, existência de algum tipo de abuso, dependência de álcool, avaliação do tipo de personalidade do indivíduo, grau de inteligência e outros sintomas psiquiátricos. Nas mulheres existe um menor índice de crimes violentos, justificando essa diferença no fato de os homens apresentarem maior insensibilidade emocional em relação às mulheres. Atos violentos cometidos por elas aparecem ligados ao uso de drogas, como álcool e maconha.

Ao sofrerem traumas na infância, as mulheres tendem a apresentar chances maiores em comportamentos agressivos quando adultas. Além disto, a negligência emocional nas mulheres é fator impactante no comportamento antissocial, como tendência ao isolamento e introversão. Na adolescência, cresce e intensifica os comportamentos antissociais, uso de substâncias como álcool e outras drogas, bem como comportamentos sexuais promíscuos e perversos. Quando adultas, não lidam bem quando são contrariadas, sendo muito persuasivas, sedutoras e carismáticas, têm contato volúvel com a realidade e dificilmente possuem relacionamentos emocionais intensos.

A impulsividade não aparece com um traço comum nas mulheres com este transtorno, da mesma forma como aparece nos homens, mas a insensibilidade, a violência, as emoções superficiais e a ausência de culpa são características comuns aos dois.

As mulheres psicopatas se comportam de maneira mais velada, elas se sentem superiores, mas sua finalidade é aumentar a autoestima alheia para conseguirem estar no controle. É uma agressividade silenciosa, perigosa e destrutiva. Ao contrário dos psicopatas homens, nas mulheres psicopatas a agressão, em geral, não é comportamental, mas psicológica. Elas são poderosas manipuladoras, fazem chantagem, exercem o controle, humilham, destruindo suas vítimas emocionalmente.

Casos Reais de mulheres diagnosticadas ou apontadas como psicopatas (ou com traços psicopáticos):

Casos Internacionais:

 1. Aileen Wuornos (EUA) – Conhecida como “a primeira serial killer feminina” amplamente noticiada nos EUA. Matou sete homens entre 1989 e 1990. Diagnosticada com Transtorno de Personalidade Antissocial e Borderline. Estudada por seu histórico de abuso, prostituição e violência extrema.

 2. Myra Hindley (Reino Unido) – Com seu parceiro Ian Brady, sequestrou, abusou e matou cinco crianças nos “Moors Murders” (1963–1965). Sua frieza e lealdade ao parceiro são usadas como exemplo de psicopatia relacional.

 3. Rosemary West (Reino Unido) – Participou com o marido Fred West de múltiplos homicídios e abusos sexuais, incluindo vítimas da própria família. Conhecida por seu sadismo e ausência de empatia.

 Casos Brasileiros:

 1. Suzane von Richthofen – Planejou e participou do assassinato dos pais em 2002. O caso é estudado pelo alto grau de manipulação e frieza, bem como pelo papel da motivação emocional e patrimonial.

 2. Ana Carolina Jatobá – Condenada pela morte da enteada Isabella Nardoni (2008). A crueldade e a ausência de arrependimento são discutidas em termos de traços psicopáticos e narcisistas.

 3. Crimes de “Viúvas Negras” no Brasil – Vários casos de mulheres que seduziram, manipularam e mataram parceiros por herança ou seguro de vida, como o caso de “Viúva da Mega-Sena” (Adriana Ferreira Almeida, condenada por mandar matar o marido Renné Senna, 2007).

4. Elize Matsunaga – Assassinou e esquartejou o marido Marcos Matsunaga (2012). Embora não seja oficialmente diagnosticada como psicopata, o caso é explorado pelo planejamento, pela racionalidade pós-crime e pela narrativa emocional.

Psicopatia Feminina nos Cinemas

Em 1992, um exemplo de psicopatia feminina (nível grave) foi retratado nas telas dos cinemas, pelo clássico filme “Instinto Selvagem” protagonizado pela atriz Sharon Stone.

Catherine Tramell (Sharon Stone) é uma autora de romances criminais atraente, mas manipuladora como todo bom psicopata. É investigada pelo detetive Nick (Michael Douglas), por suspeita de ter matado seu amante com um picador de gelo. Tinha atração por assassinos e era também uma assassina compulsiva (Serial Killer).

Estudos e dados científicos

  • Mulheres psicopatas representam menos de 1% da população feminina, mas seu impacto pode ser grave e duradouro nas vítimas.Psicopatia Feminina nos Cinemas
  • Robert Hare, criador da PCL-R (Psychopathy Checklist-Revised), aponta que mulheres psicopatas pontuam alto em manipulação emocional e mentira compulsiva, e têm menor envolvimento com violência física direta do que os homens psicopatas.
  • Pesquisas apontam maior prevalência de psicopatia feminina em ambientes corporativos (psicopatas sociais), relações abusivas (psicopatas íntimas), contextos judiciais (como em alienação parental ou falsificação de acusações).

Psicopatia em mulheres: uma manifestação diferente

1. Menos visível, mais sutil: Mulheres psicopatas tendem a agir de formas menos fisicamente violentas e mais emocionalmente destrutivas:

  • usam charme, sedução, mentira e manipulação emocional,
  • exploram vínculos afetivos (familiares, amorosos, sociais),
  • cometem agressões indiretas (como difamação, chantagem, alienação parental).

2. Psicopatia relacional: Um termo cada vez mais usado para mulheres psicopatas é o de “psicopatia relacional”, por se manifestar no controle emocional e psicológico dos outros, ao invés de crimes visíveis ou agressões físicas. Exemplo: uma mulher que manipula o parceiro para isolar-se da família, provoca intencionalmente conflitos, mente compulsivamente e sabota a autoestima do outro.

3. Uso de papéis sociais como disfarce: Pelo fato de a sociedade ter expectativas de empatia e cuidado das mulheres, muitas psicopatas se escondem sob máscaras de “boa mãe”, “amiga protetora” ou “companheira carinhosa”, enquanto manipulam e prejudicam os outros por trás dessas aparências.

Traços comuns em mulheres psicopatas

  1. Falsidade emocional: Demonstram afeto superficial, mas sem empatia verdadeira.
  2. Mentira crônica: Criam narrativas falsas, mesmo sem ganho direto, apenas por prazer do controle.
  3. Vitimismo estratégico: Usam o papel de vítima para manipular, desviar culpa ou obter atenção.
  4. Sedução como arma: Utilizam aparência, sexo ou carisma como forma de dominar emocionalmente.
  5. Relacionamentos tóxicos: Constroem laços destrutivos e cíclicos (idealização → desvalorização → descarte).
  6. Comportamento impulsivo e inconsequente: Podem usar filhos, dinheiro, amigos ou colegas como ferramentas para seus fins.

Referências Bibliográficas:

  1. Hare, Robert D.Without Conscience: The Disturbing World of the Psychopaths Among Us (1993).
  2. Lent, Robert – Neurociência da Mente e do Comportamento – 2ª edição.
  3. Raine, Adrian – A Anatomia da Violência – Editora Artmed (2015)
  4. Babiak, Paul & Hare, Robert D.Snakes in Suits: When Psychopaths Go to Work (2006).
  5. DeLisi, Matt (ed.)The Routledge International Handbook of Psychopathy and Crime (2018).
  6. DSM-5 – Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais.
  7. https://www.scielo.org/pt/sobre-o-scielo/bibliografia-scielo/


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